Muitos trabalhadores recorrem a bicos e alguns aproveitam FGTS para
investir tempo num negócio próprio. Situação é particularmente difícil
para jovens
Por Mariana Estarque
Esperar aquela ligação que nunca vem. Deixar currículos pela cidade,
ir a dezenas de entrevistas, voltar sem nada. A frustração é comum a
milhares de brasileiros em busca de trabalho em meio à crise econômica.
Segundo pesquisa do IBGE divulgada na terça-feira 15, a taxa de
desemprego chegou a 9% no último trimestre de 2015.
"Já levei meu currículo a vários lugares, mas nunca me ligam. A crise
está horrível, afetou geral", conta Jonathan Oliveira, de 18 anos.
Antes de ser demitido, em janeiro, ele dividia o tempo entre a escola e o
trabalho como jovem aprendiz, na função de auxiliar administrativo.
Ficou no emprego durante 11 meses, com um salário de 900 reais. Como
não completou um ano no trabalho, Jonathan não tem direito ao
seguro-desemprego – as regras de acesso ao benefício mudaram no ano
passado.
"O seguro vai fazer muita falta", lamenta ele, que mora com a avó e
os irmãos no bairro da Armênia, na zona Norte de São Paulo. "Ela
trabalha como metalúrgica, mas o dinheiro não dá para a família toda",
explica.
Para quem procura o primeiro emprego, em geral jovens como Jonathan, a
situação é ainda mais difícil. De acordo com a Pnad Contínua (Pesquisa
Nacional por Amostra de Domicílios), do IBGE, a taxa de desemprego entre
pessoas de 18 a 24 anos foi de 19,4% no último trimestre de 2015, mais
que o dobro da percentagem de desocupados na população em geral.
"Ela não tem experiência, então, fica pior para achar uma
oportunidade", diz José do Nascimento, de 40 anos, que acompanhou a
filha ao Centro de Apoio ao Trabalhador (CAT), da Prefeitura de São
Paulo, no centro da cidade.
Com a crise, as vendas no comércio de José caíram 40% nos últimos
meses, e a filha, Daiane, decidiu procurar o primeiro emprego. "Não
passei no vestibular de Farmácia. Vou prestar de novo no ano que vem,
mas, até lá, queria ser atendente de uma farmácia", conta a jovem de 18
anos.
O caso de Daiane é cada vez mais comum. De acordo com o IBGE, entre o
último trimestre de 2014 e o mesmo período de 2015, dois milhões de
brasileiros ingressaram na força de trabalho, o que significa que estão
em idade ativa e dispostos a trabalhar.
Com a crise, segundo o instituto, pessoas que não costumavam buscar
emprego, como muitos estudantes, decidiram entrar no mercado de trabalho
para complementar a renda domiciliar, seja porque um dos parentes foi
demitido, seja porque houve alguma perda nos ganhos da família.
Depois de oito meses procurando uma vaga e dezenas de
entrevistas, Clovis Pirinelli, de 31 anos, decidiu investir seu tempo
num negócio próprio. O engenheiro de computação, com MBA no currículo,
ganhava cerca de oito mil reais num banco quando foi demitido, em abril
de 2015.
"Fui em média a três entrevistas por mês. Ou a vaga era fechada no
meio do processo, ou me ofereciam menos da metade do meu salário
anterior. Acabei desistindo, porque sempre tive o sonho de ter um
negócio meu", conta.
Na época, o engenheiro havia se mudado para a casa dos pais, por
questões pessoais. Quando veio a demissão, decidiu ficar com eles, para
economizar com o aluguel. E a ideia para o negócio veio do próprio
ambiente familiar.
"Há tempos queria abrir uma franquia no ramo de alimentos, mas não
tinha escolhido nenhuma ainda. A minha mãe tinha uma empresa de
bem-casados, que estava desativada, e decidi entrar no negócio com ela.
Estou investindo em divulgação e em um novo site", afirma.
Mesmo com uma renda inferior ao que ganhava como engenheiro, Clovis
acredita que a escolha foi acertada. "Estamos com uma boa demanda. No
futuro, acho que vou ganhar melhor e vou construir algo próprio."
A opção de Clovis é comum entre brasileiros desempregados, que,
muitas vezes, aproveitam o Fundo de Garantia do Tempo de Serviço (FGTS)
para investir num projeto pessoal. Segundo uma pesquisa do Sebrae, o
empreendedorismo por necessidade saltou de 29%, em 2014, para 44%, em
2015, devido à crise econômica.
Outra opção para quem não encontra uma vaga fixa é se manter com bicos e trabalhos como freelancer, conhecidos como frilas. Enquanto não consegue emprego, a médica Barbara Mascarenhas, de 30 anos, faz plantões esporádicos.
"O dinheiro tem dado para me virar", conta ela, que veio do Pará e
mora com a irmã, na Liberdade. Ainda assim, Barbara diz que as
remunerações pelos bicos estão cada vez mais baixas. "Tenho recebido
muito calote também", reclama.
O eletricista Ivan da Silva, de 33 anos, também tenta segurar as
pontas com bicos. Ele trabalhava com manutenção predial, mas foi
demitido há cinco meses.
"Não consegui nenhuma vaga ainda. A todo CAT que vou tem fila. No que
tem perto da minha casa, as senhas de atendimento acabam às 9h. E o
dinheiro do meu seguro-desemprego já quase terminou", lamenta.
Ivan mora em Pirituba com a esposa e o filho, de apenas dez meses de
idade. "Minha irmã trabalha numa churrascaria e está me ajudando, mas
fica apertado para ela e para nós", conta. "O dinheiro só dá para
sobreviver."
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