O que descobriríamos se os jornalistas brasileiros fossem atrás das
denúncias de sonegação que envolvem grandes grupos de comunicação e que
não viram notícia no país?
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| "Rede Global de evasão fiscal"
Por Bruno Marinoni*
“Siga o dinheiro”, aconselhava William Mark Felt, o “garganta
profunda”, aos jovens jornalistas que, nos anos 70, revelaram todo um
esquema de espionagem e corrupção no interior da Casa Branca.
O que não
descobriríamos então se os jornalistas da mídia brasileira
investigassem, por exemplo, a denúncia de que a Globo deve mais de R$
600 milhões aos cofres públicos porque sonegou o imposto decorrente da
compra dos direitos de transmissão da Copa de 2002?
O caso, que já vinha sendo anunciado há algum tempo, ganhou novo
capítulo no último dia 17 de julho, quando 29 páginas do processo na
Receita Federal contra a Globo foram divulgados em um blog na internet. A
emissora teria usado 10 empresas criadas em paraísos fiscais para
esconder a fraude. Com o esquema, o sistema Globo teria incorrido em
simulação e evasão fiscal. O imposto sobre importâncias enviadas para o
exterior para aquisição de direitos de transmissão no caso da empresa
beneficiária estar sediada em paraísos fiscais seria de 25%, se fosse
pago.
E se os jornalistas da nossa mídia fossem, por outro exemplo, atrás
do papel que a Igreja Universal, milionária e com isenção fiscal por se
tratar de uma entidade religiosa, cumpre no financiamento da Record? Uma
matéria intitulada “Macedo nega uso do dinheiro da igreja na compra de
TV”, publicada na Folha de São Paulo, em setembro de 1998 (quando a
emissora não era ainda uma competidora de peso), afirmou que
investigações da Receita resultaram em uma multa de R$ 265 milhões ao
grupo. A maior parte do pagamento, ou R$ 118 milhões, coube à Record;
outros R$ 98 milhões, à própria Igreja Universal, e mais R$ 6 milhões, a
Edir Macedo. Esses valores se refeririam a autuações e multas por
sonegação fiscal e outras irregularidades.
Além disso, a imprensa já veiculou algumas vezes que a Igreja
Universal compraria a faixa da madrugada da TV Record, que tem
baixíssima audiência, por um preço muito acima do mercado. Todavia, até
onde sabemos, nada foi feito para resolver essa questão.
Em 2010, foi a vez de Sílvio Santos, dono do SBT, se envolver em um
escândalo de fraude fiscal, uma dívida de R$ 3,8 bilhões. O evento não
se relacionava diretamente com os meios de comunicação, e sim com seu
banco, o “Panamericano”. O dono da empresa, porém, empenhou todo o seu
patrimônio, inclusive seus canais de TV, como garantia de que a dívida
seria sanada.
Quando poucos grupos controlam os meios de comunicação, quando há
concentração do poder midiático é fácil criar um bloqueio a informações
desfavoráveis aos donos da mídia por meio de uma estratégia “positiva”:
preenchendo-se a agenda de temas discutidos pela sociedade com uma série
de assuntos que não atinjam os interesses daqueles que controlam os
canais de comunicação.
Escândalos de corrupção e desvio de dinheiro público são sempre
matérias na nossa imprensa, mas qual a seleção de casos que é feita? O
que fica de fora? Quem fica de fora dessas páginas? Se há um grande
número e diversidade de atores dirigindo os meios de comunicação, maior a
possibilidade de nos relacionarmos com canais suficientemente
independentes para nos fornecer informações de interesse público. Mas
isso é algo em falta no Brasil.
* Bruno Marinoni é repórter do Observatório do Direito à Comunicação, doutor em Sociologia pela UFPE e integrante do Intervozes.
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