O iraniano Mohsen Makhmalbaf capta o ditador em cada um
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| “Algumas crianças vão crescer e achar que podem oprimir outros seres humanos” |
De longe todo ditador assusta, de perto pode ser risível. É assim que o diretor iraniano Mohsen Makhmalbaf justifica a mudança de tom de O Presidente.
De início uma alegoria satírica, o filme torna-se mais dramático e
assume o registro de parábola com a intenção de representar não um em
especial, mas todos os Estados ditatoriais. “De ontem, de hoje, e muito
provavelmente de amanhã”, disse em entrevista no Festival de Veneza há
dois anos. Se o Brasil enfrentou ditaduras e na última década contou com um presidente popular eleito pelo povo, frisou a CartaCapital, precisa sempre estar atento a não retroceder e zelar pelo maior tesouro, a liberdade.
Makhmalbaf pode expressar-se e trabalhar
porque deixou o Irã em 2005. Enquanto seu colega Jafar Panahi filma no
país de forma clandestina e cumpre prisão domiciliar, ele viabiliza na
Geórgia uma produção de maior magnitude se comparada a filmes intimistas
anteriores. Sem perder o conceito humanista que o consagrou. “Nascemos
crianças inocentes, mas algumas vão crescer e achar que podem liderar e
oprimir outros seres humanos com um papel divino, o que tento
compreender com esse filme.”
O Presidente. Mohsen Makhmalbaf
Por isso a opção de representar as duas
pontas desse processo na figura de um avô e seu neto. O primeiro, o
presidente (Mikheil Gomiashvili), veste uniforme militar para comandar
uma república hipotética no Cáucaso. Tem afeto particular pelo neto
(Dachi Orvelashvili) e com ele no colo protagonizará cena simbólica do
poder, quando para divertir o garoto manda acender e apagar as luzes da
capital. Em certo momento, a iluminação não volta, ouvem-se
metralhadoras e o levante da população se dá. Disfarçado, o mandatário
foge com o menino e conhece as agruras da miséria que produziu no seu
território.
O cineasta reconhece o apelo a certos estratagemas de convenção, um
didatismo ingênuo que acredita ser inerente a esse tipo de universo
autoritário e seus defensores. Produz, contudo, imagens fortes, como a
da bebida a passar de mão em mão entre prisioneiros políticos e o
ditador caído em desgraça. “Não há um ridículo nesses homens e seus
palácios, no comportamento cínico e ambicioso que chega a constranger?”,
pergunta, como em busca de confirmação. A resposta está mais latente do
que nunca.

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